As diferenças entre gostos musicais, vestimentas, gestuais e “modus vivendi”, muitas das vezes, apartam as pessoas umas das outras. Situações como esta até mesmo podem fazer com que grandes amigos de uma vida inteira sequer se conheçam por viverem universos culturais supostamente diferentes.
Gostaria que estas palavras, as quais derramo mais pelo coração do que pela dialética (no sentido do platonismo), sem perder o foco na estética de nosso vernáculo pátrio, possam demonstrar o quão importante é permitir-se conhecer outros mundos que vão muito além de nosso próprio imaginário.
Em 28 de agosto de 2023 perdi um amigo meu de adolescência e juventude, cantor e compositor do universo do funk, o jovem MC Phabllo. Quando situações desta envergadura acontecem a gente logo se coloca a pensar em algumas questões, tais como a brevidade da vida, a fragilidade de nossos corpos, a necessidade de nos cuidarmos e o quanto envelhecemos sem perceber.
Quando conheci o Pablo ele era um menino franzino, cheio de sonhos, que queria alcançar a fama através da arte abarcada pelo mundo do funk. Confesso que, de cara, logo gostei dele, pois era irmão de uma grande amiga (atualmente minha comadre, a Pâmela) e nada mais admirável do que alguém com sonhos que passam em seus olhos como um filme. Amizades assim não tem data certa para começar, tampouco pretendem que a sua interrupção seja tão precoce.
Eu não gostava de ouvir funk, não gostava do estilo, e, logo eu, passara a ter um novo amigo funkeiro e que gostava que eu ouvisse suas músicas. Quando na casa de Fabio e Pamela, hoje meus compadres, ele colocava as suas obras para que ouvíssemos. Era uma maneira diferente de degustar uma música brasileira bem distinta de Milton Nascimento, Elis Regina e Chico Buarque entre outros medalhões da Música Popular Brasileira.
Confesso que sempre reclamei com ele dos palavrões nas suas músicas e, assim o fazia, por conta de nossa fraterna amizade. Busquei entender um pouco deste universo através dele e para que tenham noção dos fatos, a única pessoa no planeta que conseguiu me fazer “encarnar” o espírito funkeiro e fez com que fosse vê-lo em um show chamava-se Pablo da Cruz Bezerra, o MC Phabllo. Lembro-me como se agora houvesse ocorrido: Ele subira no palco, com uma máscara de carnaval do “Bin Laden” e meu amigo deu o seu show, a meu ver engraçado, mas que levantou a galera. Eu descobri um pouco mais sobre aquele gosto musical peculiar das pessoas e, dali para frente, passei a respeitar esse movimento cultural e popular que havia encontrado através dele. Foi ele que, sem querer, me ensinou isso, a respeitar todos os movimentos musicais. Acredito que ele tenha sido um dos maiores defensores do funk na Baixada Fluminense, sem politização ou bandeiras. Apenas sendo ele mesmo com seu talento e sua música.
A sua humildade, humanidade e coração muito bom sempre serviram de exemplo para todos nós e quebraram barreiras. Talvez seja por isso a tristeza de tantos e tantas em Nilópolis, no Rio e até fora do Estado.
É válido lembrar que crescemos da adolescência para cá, juntos. Eu na política. Ele no funk. Eu padrinho do sobrinho dele. Ele tio de meu afilhado. Ainda que distantes, por alguns momentos, Pamela, Pablo, Fabio e eu sempre nos tratamos como família.
Sobram lembranças de momentos de grana curta e íamos comprar vinhos de R$ 10 reais, um queijo mais ou menos no mercado, uns biscoitos e a gente era feliz. Fomos muito felizes. E é isso que importa. Felicidade de verdade está nos momentos mais simples…
Certa vez, em Ipanema, na presença de uma atriz que havia feito novela na Record, e ele sem saber quem era ela, fez amizade, emprestou carregador de telefone, etc. e tal. Ele era um ser humano doce, alegre, gentil, com todo mundo.
Naquele dia demoramos muito para chegar ao espetáculo teatral que fui cobrir pela Revista Factum à época e o convidei, como artista para conhecer. Andamos de trem, de carro por aplicativo e foi um verdadeiro programa fora dos padrões. Foram horas para chegar até lá e, quando chegamos, o espetáculo estava terminando. Por derradeiro ficamos por Ipanema mesmo e conversamos muito sobre a vida. Eu falava sobre meus filhos. Ele sobre a família, a carreira. Foi a última vez que saímos juntos. Esta foi a oportunidade que retribuí, sem perceber, aquele convite que ele me fez para ir ao seu show.
A vida é muito curta, de verdade. Ele se foi, ficará a saudade, jamais a tristeza pois a vida tem destas coisas. A vida é sobre amizade, sinceridade, carinho, respeito, sorrisos verdadeiros.
Pablo e Pedro Henrique. Foto: DivulgaçãoTodos, na vida, deveriam conhecer um amigo como Pablo. Um menino grande. Meio avoado, às vezes pensativo e criativo com seus versos. Por vezes um sábio, com o término de suas frases com: “Tá ligado!”.
Permita-se viver e conhecer outros mundos diferentes dos seus e, um dia, você poderá contar numa roda de amigos, ou para seus filhos, ou quem sabe para seus netos, como a vida é boa quando a gente se despe dos grilhões que nos amarram… sejam eles culturais ou sociais.
Obrigado, Pablo! do seu jeito, você foi um herói na vida de muita gente! Deixou a vida, se tornou história e pelos amigos sempre será lembrado com muito carinho. O seu legado será a alegria de viver.