No passado a presença de uma cabine policial era sinônimo de estar em um local seguro, mas com o passar dos anos, a estratégia de manter policiais dentro de cabines foi abandonada pelas autoridades de segurança pública. Em Nilópolis atualmente ainda há mais duas cabines, todas posicionadas nas entradas e saídas do município, mas nenhuma delas é usada efetivamente.
Nesta quinta-feira (18), uma ocorrência inusitada chamou a atenção e reacendeu o debate em torno do uso das cabines pela Polícia Militar. No final da tarde, um bandido em fuga capotou com um carro na saída da RJ-081 (Via Light) para a rua Antônio José Bittencourt, no bairro Novo Horizonte. Apesar do acidente, o bandido conseguiu sair ileso e com uma arma em punho, ainda fez mais uma vítima. Um motociclista que passava pelo local foi obrigado a entregar a sua moto para o bandido, que fugiu em direção ao bairro de Vila Norma, em São João de Meriti. Ironicamente tudo isso aconteceu, justamente, em frente à uma cabine da Polícia Militar.
Em um vídeo, feito por um motorista que passava na hora, é possível ver que um homem sai do carro capotado e aponta a arma para o motociclista, que está bem na direção da cabine policial. Nas redes sociais, a cena gerou revolta, principalmente pelo fato de toda a ação ter ocorrida em um local que deveria estar protegido.
Para o especialista em segurança pública, Roberto Dória, o bandido deve conhecer bem a área e saber que naquela cabine não ficam policiais:
“Apesar da ação ter sido bem rápida, pelo tempo do capotamento até a saída do meliante do carro, se a cabine estivesse ocupada, dava tempo do policial intervir e evitar a fuga. Infelizmente, os últimos governantes desistiram de usar esses equipamentos como meios de proteção à sociedade. Porém, mantiveram os equipamentos, mas vazios. Ainda analisando o vídeo, me parece que o bandido já conhecia aquela área e por isso não se intimidou e saiu tranquilamente, até mesmo se certificando que não havia nenhuma resistência policial”, disse.
De acordo com a Polícia Militar, policiais foram acionados sobre o roubo de um automóvel HB20 e imediatamente iniciaram uma varredura na região, quando se depararam com o veículo capotado e sem nenhum ocupante. Até o fechamento desta edição, o bandido não havia sido capturado e não há informações se havia outros ocupantes no veículo acidentado.
Cabines foram reativadas em 2022
A cabine localizada na saída da RJ-081 (Via Light) para a Rua Antônio José Bittencourt, no bairro Novo Horizonte, foi reativada em 2022, juntamente com a localizada na Praça Joaquim Manoel Casimiro, em Olinda. Na época o 20º Batalhão de Polícia Militar (Mesquita) com o intuito de aumentar ainda mais a segurança de toda a sua área de cobertura (Mesquita, Nova Iguaçu e Nilópolis), reativou todos as cabines de atuação dos policiais militares nos três municípios. A ação foi em parceria com as prefeituras.
Porém, segundo moradores das localidades onde estão as cabines, a presença dos policiais foi ficando cada vez mais raras. Atualmente, contam eles, nenhum policial é visto dentro das cabines há mais de um ano:
“Quando reformaram ficamos felizes, pois sou do tempo em que a presença dos policiais na cabine inibia a ação da bandidagem, mas depois de algum tempo, os policiais foram sumindo. Vinham, ficavam um tempinho e depois iam embora, de um ano para cá, sumiram de vez. Ficou só a cabine mesmo”, contou um morador do bairro Nova Cidade, que não quis se identificar.
Já em Olinda, a situação é um pouco diferente. Uma moradora conta que, apesar de não ficarem dentro da cabine, os policiais costumam se fazer presentes com viaturas, mas ela diz se sentir mais segura quando a cabine era um Destacamento de Policiamento Ostensivo:
“Aqui era um DPO, a polícia ficava aqui direto, todos os dias e 24h, mas isso já tem mais de 10 anos, depois foi minguando cada vez mais, acabaram com o DPO e virou só cabine mesmo. Hoje os policiais até estão vindo, mas não usam a cabine, eles ficam nos carros, passam algumas horas e depois saem. Não posso dizer que não há policiamento, mas era melhor quando ficavam direto. Nos ajudavam muito. Nós tínhamos até o telefone de lá, acontecia alguma coisa, ligávamos para eles e rapidinho nos atendiam”, conta a aposentada, que também optou pelo anonimato.
No outro extremo da Rua Getúlio de Moura, na divisa com Mesquita, a situação é pior. A cabine construída em meados de 2010 sequer chegou a ser ocupada efetivamente pela Polícia Militar. Hoje o espaço é apenas um pequeno imóvel fechado.
A situação de abandono das cabines policiais não é uma realidade só de Nilópolis. Em vários ponto do Rio de Janeiro é possível encontrar situações parecidas, ou até piores. O problema segundo especialistas é a falta de efetivo.
“Hoje a Polícia Militar trabalha no seu limite. Vemos diariamente casos de violência em todos os pontos do Rio de Janeiro, e isso é reflexo da falta de uma política eficiente de segurança pública. O abandono das cabines é justamente pela falta de efetivo. Os comandantes dos batalhões acabam sendo obrigados a empregar todo o efetivo possível no patrulhamento ostensivo das ruas. Entendo, que é a solução mais adequada neste momento, mas o ideal seria mudar essa realidade”, diz o especialista Roberto Dória.
Para Dória, as cabines poderiam ser usadas como pontos de apoio ao patrulhamento ostensivo, colocando mini centrais de monitoramento das áreas onde estão. O especialista explica, que a ocupação poderia feita através de parceria entre Estado e Município:
“Há iniciativas onde agentes da Guarda Municipal e policiais militares, e até mesmo outros setores da segurança pública, ocupam esses espaços como apoio ao patrulhamento ostensivo, monitorando as áreas e repassando aos policiais em campo as situações. Acredito que iria reduzir muito o tempo de ação da polícia”, concluiu.